tinham passado dez anos. mais precisamente dez anos, dois meses e três dias. ela estava esquecida, mais do que nunca. talvez fossem as preocupações, ou talvez não. o trabalho, a casa, o marido, os filhos, a possível ida para s. tomé. tudo lhe tirava um pouco de sono, mas mesmo assim, tinha tempo para tudo, mesmo que não dormisse.
já estava perto o natal. faltava menos de um mês. o pouco tempo que sobrava entre deixar as crianças na escola, trabalhar, ir buscar as crianças ao atl, não era suficiente para terminar as compras de natal. decidiu guardar um fim-de-semana do início de dezembro para comprar os presentes em falta. estava tudo planeado, o marido cancelou uma viagem a nova deli e os miúdos fizeram os trabalhos da escola todos no atl, na sexta-feira.
chegado o sábado de manhã e as crianças não queriam levantar o rabo da cama. teve de ser o miminho típico da mãe carinhosa a erguer-lhes a vontade necessária para dois dias de centro comercial.
eram 9h da manhã e o pequeno almoço estava servido. as torradas sem manteiga que o marido adorava e os cereais de chocolate para os meninos. apesar da falta de tempo, "sara" sempre achou desnecessário ter uma empregada.
todos prontos para sair de casa e o telemóvel de "samuel" toca. Sara previu que os planos para o fim-de-semana em família iriam por água abaixo e saiu com os meninos para o carro, torcendo o nariz.
confirmou o que temia. reunião de última hora, por causa de mais um negócio de última hora, de mais um cliente de última hora. e na última da hora, trocou mais uma vez a família pelo trabalho.
sara ficou furiosa e saiu de rompante com os filhos, em direção ao centro comercial, ignorando os acenos do marido.
ao chegar ao centro comercial entra na primeira loja e começa a procurar uma prenda para o pai. talvez uma camisa ou um perfume.
ao sair da loja, tendo-se decidido pelo perfume, dá de caras com "manuel". o eterno amor de adolescente. a principio ele não a reconheceu, mas o olhar fixo dela nele, rapidamente desfez as dúvidas e o fez pensar melhor, que aquele olhar seria inconfundível, por mais anos que passassem.
em menos de cinco minutos resumiram dez anos. a carreira, a família, os sonhos,... havia tantos pormenores que escapavam a sara e que tinham de ser esclarecidos, que de imediato trocaram números de telefone e um café ficou combinado para o dia seguinte.
manuel ficou um pouco surpreendido, mas adorou os filhos de sara. aqueles filhos que um dia tinham planeado ter juntos.
no dia seguinte sara apareceu no café um pouco atrasada. tinha deixado os filhos com a sua mãe, para conversar mais a vontade com manuel. puseram toda a conversa em dia. falaram do passado mal resolvido para ambos. manuel nunca tinha aceitado a fuga de sara para o "brasil" quando tinha 18 anos. depois disso nunca mais tinha tido notícias dela. já sara estava mais preocupada em recuperar tempo perdido e saber tudo sobre manuel, ficando a saber que este tinha perdido a sua mulher numa acidente de avião há dois anos atrás. sara, sem saber o que dizer, apenas conseguiu pedir desculpa. talvez pela ausência no momento difícil.
com o afastamento progressivo de samuel, os encontros de sara e manuel foram-se tornando mais regulares ao ponto de sara mentir ao marido quando tinha encontros marcados com manuel, por mais inocentes que estes fossem. na cabeça de sara, nada era inocente, já que o amor que a uniu a manuel em tempos, estava a voltar e cada vez com mais força.
será que dez anos depois sara conseguiria remediar o seu erro? conseguiria ela fazer com que manuel a visse como a rapariga que conheceu?
esta é uma realidade que pode ser vivida por todos nós, que tantas vezes por medo, desistimos daquilo que nos faz mais felizes. sem sabermos se a vida nos dará uma segunda oportunidade num centro comercial, para recomeçar.